terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

HÁ UM SÉCULO

"Nascer, morrer, renascer ainda e progredir sempre, tal é a lei."




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HÁ UM SÉCULO


HILÁRIO DA SILVA
Psicografada por WALDO VIEIRA
Sobre o Item 2 do Cap. XXV[1]



I

Allan Kardec, o Codificador da Doutrina Espírita, naquela triste manhã de abril de 1860, estava exausto, acabrunhado.
Fazia frio.
Muito embora a consolidação da Sociedade Espírita de Paris e a promissora venda de livros, escasseava o dinheiro para a obra gigantesca que os Espíritos Superiores lhe haviam colocado nas mãos.
A pressão aumentava...
Missivas sarcásticas avolumavam-se à mesa.
Quando mais desalentado se mostrava, chega a paciente esposa, Madame Rivail – a doce Gaby –, a entregar-lhe certa encomenda, cuidadosamente apresentada.

II

O professor abriu o embrulho, encontrando uma carta singela. E leu:

“Sr. Allan Kardec:
Respeitoso abraço.
Com a minha gratidão, remeto-lhe o livro anexo, bem como a sua história, rogando-lhe, antes de tudo, prosseguir em suas tarefas de esclarecimento da Humanidade, pois tenho fortes razões para isso.
Sou encadernador desde a meninice, trabalhando em grande casa desta capital.
Há cerca de dois anos casei-me com aquela que se revelou minha companheira ideal. Nossa vida corria normalmente e tudo era alegria e esperança, quando, no início deste ano, de modo inesperado, minha Antoniette partiu desta vida, levada por sorrateira moléstia.
Meu desespero foi indescritível e julguei-me condenado ao desamparo extremo.
Sem confiança em Deus, sentindo as necessidades do homem do mundo e vivendo com as dúvidas aflitivas de nosso século, resolvera seguir o caminho de tantos outros, ante a fatalidade...
A prova da separação vencera-me, e eu não passava, agora, de trapo humano.
Faltava ao trabalho e meu chefe, reto e ríspido, ameaçava-me com a dispensa.
Minhas forças fugiam.
Namorava diversas vezes o Sena e acabei planeando o suicídio. “Seria fácil, não sei nadar” – pensava.
Sucediam-se noites de insônia e dias de angústia. Em madrugada fria, quando as preocupações e o desânimo me dominaram mais fortemente, busquei a Ponte Marie.
Olhei em torno, contemplando a corrente... E, ao fixar a mão direita para atirar-me, toquei um objeto algo molhado que se deslocou da amurada, caindo-me aos pés.
Surpreendido, distingui um livro que o orvalho umedecera.
Tomei o volume nas mãos e, procurando a luz mortiça de poste vizinho, pude ler, logo no frontispício, entre irritado e curioso:
“Esta obra salvou-me a vida. Leia- com atenção e tenha bom proveito. – A. Laurent”.
Estupefato, li a obra – “O Livro dos Espíritos” – ao qual acrescentei breve mensagem, volume esse que passo às suas mãos abnegadas, autorizando o distinto amigo a fazer dele o que lhe aprouver”.

Ainda constavam da mensagem agradecimento finais, a assinatura, a data e o endereço do remetente.
O Codificador desempacotou, então, um exemplar de “O Livro dos Espíritos” ricamente encadernado, em cuja capa viu as iniciais do seu pseudônimo e na pagina do frontispício, levemente manchada, leu com emoção não somente a observação a que o missiva se referira, mas também outra, em letra firme:

“Salvou-me também. Deus abençoe as almas que cooperaram em sua publicação. – Joseph Perrier.”

III

Após a leitura da carta providencial, o Professor Rivail experimentou nova luz a banhá-lo por dentro...
Conchegando o livro ao peito, racionava, não mais em termos de desânimo ou sofrimento, mas sim na pauta de radiosa esperança.
Era preciso continuar, desculpar as injúrias, abraçar o sacrifício e desconhecer as pedradas...
Diante de seu espírito turbilhonava o mundo necessitado de renovação e consolo.
Allan Karde levantou-se da velha poltrona, abriu a janela à sua frente, contemplando a via pública, onde passavam operários e mulheres do povo, crianças e velhinho...
O notável obreiro da Grande Revelação respirou a longos haustos, e, antes de retomar a caneta para o serviço costumeiro, levou o lenço aos olhos e limpou uma lágrima...


MINHA REFLEXÃO

O ser humano não foi jogado no mundo a sua própria sorte. Deus é todo justo e bondoso e não quer que seus filhos se desfaleçam diante das provas ou expiação. É bem verdade que muitos chegam às raias da loucura e às vezes até recorrem ao suicídio.
O Espiritismo nos esclarece sobre a nossa origem no "O Livro dos Espíritos" e afirma que a morte não existe. Entretanto, os que se suicidam perduram alguns anos numa região de baixo teor vibratório, em pleno sofrimento.
Jesus nos ensinou que devemos ser ativos num momento de aflição. Com a máxima Buscai e Achareis nos asseverou que o Pai maior nunca nos abandona e, pelo contrário, sempre nos dá a força e inspiração necessárias para enfrentarmos um momento de provação ou até mesmo de expiação.
Então, devemos pensar que em vez de descermos aos níveis mais baixos da humanidade, devemos é crescer como Espírito e aproveitar bem a presente reencarnação, não nos deixando abater com depressões que nos jogam direto para as nossas más inclinações, fazendo com que diminuamos o nosso potencial espiritual que uma vida corpórea nos oferece.
Na nota de rodapé que segue, coloquei a passagem que serviu de inspiração para a mensagem de Hilário Silva. Ela nos esclarece sobre a necessidade de nos manter estimulados ao trabalho com vista ao nosso progresso e ao dos nossos semelhantes, mesmo em circunstâncias menos favorável. Foi o que Allan Kardec fez quando, muito sofrido pelos descasos dos adversários, lhe chegou às mãos algo que lhe fez ver o quão era importante a sua missão para a humanidade.
Paz e alegrias...

Item 2 do Cap. XXV de "O Evangelho Segundo o Espiritismo"
[1] 2 Do ponto de vista terreno, o ensinamento: Buscai e Achareis, é semelhante a este: Ajuda-te, e o céu te ajudará. É o fundamento da lei do trabalho e, por conseguinte, da lei do progresso, uma vez que o progresso é filho do trabalho, e que põe em ação todas as forças da inteligência do homem.
Na infância da Humanidade, o homem apenas usa da sua inteligência à procura dos alimentos, dos meios de proteger-se das tempestades e defender-se de seus inimigos. Deus, porém, diferenciando-o dos animais irracionais, deu-lhe o desejo incessante de melhorar-se. É esse desejo que o leva a pesquisar meios de melhorar sempre suas condições de vida e o conduz às descobertas, às invenções, ao aperfeiçoamento da Ciência, visto que é a Ciência que lhe proporciona o que lhe falta.(...) Porém o progresso que cada homem realiza individualmente durante a sua vida é muito pequeno, até mesmo imperceptível para um grande número deles. Como é que então a Humanidade poderia ter progredido sem a preexistência e a reexistência da alma? Supondo-se que as almas deixassem a Terra todos os dias para não mais voltar, a Humanidade não progrediria, visto que seres primitivos encarnariam incessantemente, e teriam de fazer tudo de novo e aprender tudo outra vez. Se isto ocorresse, não haveria razão para que o homem fosse hoje mais avançado do que nas primeiras idades do mundo, uma vez, a cada nascimento, todo o trabalho intelectual teria que recomeçar. Ao contrário, retornando com o progresso que adquiriu, e acrescentando a cada reencarnação alguma experiência a mais, a alma passa gradualmente do estado de selvagem à civilização material, e desta à civilização moral.